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Conto - O Quadro da Parede

  • Leandro Zapata
  • 23 de set. de 2014
  • 7 min de leitura

Samuel pendurou o quadro novo na parede sobre sua cama. Era um quadro bonito onde havia uma bela floresta que margeava um lago onde havia uma ponte coberta sobre. Dentro dessa ponte, olhando o lago, havia uma mulher de vestido. A única coisa que pôde distinguir da mulher foi o cabelo loiro e curto. Porem o quadro não era exatamente nítido, era como um borrão com formas. E isso foi o que mais atraiu a atenção de Samuel. Além disso, quando viu o quadro na loja de alguma forma ele sentiu que o quadro deveria ser comprado por ele, então ele comprou.

Naquela noite ele sonhou com a mulher do quadro, ou ele deduziu que fosse pois a mulher tinha os mesmos corte e cor de cabelo. No sonho eles estavam no quarto de Samuel, a mulher o seduzia e aos poucos tirando sua roupa e ele a dela. E eles fizeram amor durante a noite toda.

O sol estava no céu há algumas horas quando Samuel abriu os olhos. Ele estava nu, e a cama desarrumada, do mesmo jeito que estava no sonho. Mas a mulher não estava lá.

- Isso é estranho -disse a si mesmo –, eu me despi enquanto dormia?

Deu de ombros, e levantou. Era um sábado quente de verão, e ele e os amigos iam para praia. Ele se vestiu, tomou café da manhã e saiu. Eles haviam marcado de se encontrar na casa de outro amigo próximo de onde Samuel morava.

Tocou a companhia e Clara, a namorada de Júlio, que era o dono da casa onde se encontrariam, recebeu-o no portão.

- Olá -ele cumprimentou-a.

- Oi. Entra, o pessoal está lá dentro.

Entrou, estavam quase todos que tinham confirmado menos dois. Eles chegaram depois de alguns minutos e nós partimos para praia.

O dia passou rápido. Samuel estava de volta a sua casa por volta da meia-noite. Ele tomou banho e dormiu. Naquela noite ele sonhou novamente com a mulher, mas o sonho foi diferente. Ela estava deitada na cama dele e dormia um sono tranquilo. E ele estava de pé, apenas observando-a. Ela é linda, pensou. No sonho, ele ficou a noite toda olhando para ela sem mudar de posição, até que o sol surgiu pela janela e ele acordou assustado, pois não estava deitado na cama e sim em pé, onde ele estava no sonho observando a mulher.

Aquilo era muito, muito estranho. Será que ele era sonâmbulo? Andou até a cama, que estava desarrumada, como se alguém tivesse dormido nela. O colchão estava marcado por causa do peso de alguém deitado nele, mas quando Samuel tocou o colchão estava gelado, extremamente gelado. Não estava numa temperatura normal, mas sim gelado, como se o colchão tivesse passado a noite na geladeira.

Ele assistira episódios demais de Supernatural para deixar aquilo de lado. Dois sonhos estranhos do qual ele acordou de maneiras estranhas demais, o colchão gelado exatamente onde a mulher havia dormido em seu sonho e tudo isso logo após ele ter pendurado aquele quadro no quarto. Só havia uma explicação.

Samuel se trocou e ligou para Gabriel, seu amigo nerd de cento e cinquenta quilos e um metro e setenta que era muito mais fissurado que ele em mitologias e coisas sobrenaturais.

- Alô. Gabriel?

- Opa. Eu mesmo. E ae, Samuca, beleza?

- De boa, cara e com você?

- Sussa.

- Mano, deixa eu falar, você acha possível que fantasmas possam controlar sonhos e pessoas durante a noite?

- Sim, tudo é possível quando se trata de fantasmas.

- Eles podem ficar ligados em quadros?

- Claro que sim!

- Você pode me mandar uma lista de quadros supostamente amaldiçoados?

- Mando sim.

- Valeu, grande. A gente se fala. - e desligou.

Esse cara é muito nerd, pensou. Mas Samuel sabia que podia contar com ele, e que ele não falaria com ninguém sobre aquilo. Meia hora depois ele recebeu um e-mail com imagens de incontáveis quadros que, de acordo com crenças de pessoas, estavam amaldiçoados e ligados a mortes de pessoas e, às vezes, até famílias inteiras.

Um a um ele foi olhando, passou horas na frente do computador vendo quadros de artistas que ele nunca ouvira falar e de alguns famosos, como Leonardo Da Vince e Michelangelo. Até que finalmente encontrou o quadro que estava pendurado em sua parede. A artista que pintara o quadro chamava-se Margret Bernhard. Margret viveu na Alemanha de Hitler, ela tinha quinze anos quando a 2ª Guerra começou, nessa idade ela já pintava quadros; seu pai era um judeu que morava na Alemanha desde criança e sua mãe alemã. As perseguições atingiram sua cidade quando ela tinha dezenove anos, seu pai foi preso, sua mãe e ela foram estupradas e mortas da frente do judeu. Margret havia terminado aquele quadro um dia antes da chegada dos Nazistas.

A Ponte do Lago, ela batizara o quadro. Depois disso o quadro passou por diversas casas onde fora testemunha de diversos assassinatos brutais de garotas, até que o quadro desapareceu. Mas Samuel soube adivinhar onde o quadro esteve. O dono da loja onde ele o comprou era judeu, provavelmente o quadro estivera naquela família e agora ele foi vendido para Samuel.

O rapaz estava dividido, não sabia se acreditava ou não naquilo. Obviamente havia algo estranho nos sonhos, mas talvez não estivesse ligado ao quadro. Às vezes ele era apenas sonâmbulo. De qualquer forma, ele descobriria naquela noite.

De noite, Samuel estendeu um tapete no quarto. Pegou dois sacos de sal na dispensa e fez um círculo em torno de si mesmo e sentou. Esperava que ter assistido todos aqueles episódios tenham servido para alguma coisa.

Quando o relógio deu meia-noite, a mulher saiu do quadro. Mas era diferente dos sonhos, ela estava meio transparente, ele podia ver através dela, enquanto nos sonhos ela era de carne e osso. Nas duas formas ela era muito linda, tinha olhos verdes, ele reparara agora, e o cabelo loiro curto. Era mesmo a moça do quadro, que também era Margret.

- Olá. -ele disse -Meu nome é Samuel.

O fantasma não disse nada, apenas fitou os olhos de Samuel por alguns minutos. Ela não se aproximava dele, ficava na borda do círculo de sal. Ela não podia entrar. Talvez fosse por causa disso, ou talvez fosse pelo rosto tranquilo dela, mas Samuel não estava com medo. Ele meio que sentia que ela não queria machucá-lo.

Ele se levantou, sem tirar os olhos dela, e saiu do círculo. Ela não fez nada, apenas olhou-o enquanto ele deitava na cama e dormia. Ele não viu, ou sentiu, mas ela, na sua forma espectral, tocou os lábios nos dele, um beijo, e então desapareceu, ela agora estava dentro dos sonhos dele.

Naquele sonho eles apenas conversaram, ela contou-o sobre sua curta vida, como morreu e como sua alma ficou presa naquele quadro. Ela também contou que nunca machucara ninguém, que as casas onde ela estivera onde aconteceram aquelas coisas horrendas foram apenas coincidência. Na verdade, aquela era a primeira vez que conseguira sair do quadro.

Samuel escutou com atenção e depois de ela contar-lhe tudo aquilo chegou a vez dele. Ele contou sobre o mundo e o futuro após o tempo dela. Sobre o fim da guerra. Sobre o país onde ela estava, além de coisas sobre ele mesmo.

- O dia está amanhecendo. Tenho que voltar para o quadro.

- Tudo bem. -ele confirmou.

Depois que ela desapareceu, ele deitou e fechou os olhos. Ele dormiu até meio-dia, ele estava bem cansado.

No decorrer daquele dia ele pensou em como acostumara rápido com a moça, e com a ideia dela estar morta. Parecia até familiar para ele.

Aquela segunda-feira era o aniversário de morte da mãe dele, e como todos os anos, há quatro anos, ele levava flores para ela.

Andou pelo cemitério até chegar ao mausoléu de sua família. Notou uma estranha movimentação perto dele. Eles moviam um caixão para lá. Para dentro do mausoléu, que era apenas usado por sua família a gerações. Alguém de sua família havia morrido e ele não havia sido avisado? Não, isso é impossível. Andou mais rápido para a multidão que estava ali. Ele reconheceu todos os rostos que estavam ali, eram vários de seus parentes e amigos.

Como o caixão estava fechado ele não sabia quem tinha morrido. Perguntou para as pessoas, mas ninguém respondeu, ou melhor, não escutaram. Em fato, eles não estavam vendo-o. O caixão foi colocado dentro de uma tumba e enquanto eles lacravam com concreto ele leu o nome na lápide: Samuel Hans, seu nome. A data em que nascera e em que morrera, o dia anterior.

- Não. -ele disse para si mesmo. -Não, não, não... Isso é impossível.

Ele correu dali, correu o mais rápido que pode até chegar a sua casa. Subiu ao quarto, o quadro não estava lá. Ele não estava entendendo. O que estava acontecendo? Samuel precisa encontrar o quadro de qualquer forma, e só havia um lugar onde ele poderia estar.

Samuel entrou na loja, o balconista olhou assustado para a porta. Ele não olhava para Samuel, olhava para a porta, que se abriu sozinha e fechou. Ele correu por entre os corredores até encontrar o quadro, estava no mesmo lugar onde ele encontrara originalmente. Ele tentou tocar o quadro, mas sua mão atravessou-o, ele não tinha mais matéria; um corpo.

Ficou olhando o quadro até o sol se por, quando Margret saiu do quadro. Ela estava transparente, assim como o próprio Samuel.

- Eu estou morto, não estou? -ele disse.

- Sim, você está. Você morreu ontem enquanto conversávamos.

- Como assim, por quê? -ele estava triste, mas por alguma razão não podia chorar.

- Quando você saiu daqui sexta você sofreu um acidente de carro, você entrou em coma no hospital.

- Então tudo aquilo foi um sonho. A praia, nossa conversa.

- Sim, mas isso não torna menos real. Graças a você, eu pude sair do quadro.

- Como assim?

- Quando eu vi você aqui, eu te chamei, mesmo não sabendo seu nome. Senti uma vontade imensa de estar com você.

Samuel estava sem palavras, atônito. Ele estava morto. Não podia acreditar.

- Venha comigo. -ela disse.

- Para onde?

Ela olhou para o quadro e esticou a mão para ele. Samuel hesitou por um instante, mas pegou a mão dela. Os dois entraram no quadro, que agora não era mais um borrão com formas. O desenho estava nítido, como uma foto, e agora a mulher, Margret, estava lá olhando o lago e ao lado dela -ou atrás de acordo com a visão de quem olha o quadro de fora -havia um homem de terno sentado no corrimão da ponte também olhando o lago, Samuel. Ambos sorriam.

 
 
 

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